Thursday, March 27, 2008

Haja panelas


A Argentina outra vez - quase - em pé de guerra. Sector ao mesmo tempo tradicionalista e modernizante, a agro-pecuária resolveu enfrentar o governo Bonnie & Clyde do casalinho Kirchner. A troco de quê? É que, para variar, os governantes populistas argentinos dão em expropriar o sector mais produtivo da economia para - dizem eles - fazer a "justa" distribuição do rendimento. Tendo como pano de fundo a subida extraordinária dos preços dos commodities dos anos recentes o governo soixante-huitard da multimilionária díada avança com a cantiga antioligárquica, ultrapassada e pestilenta, a qual podia ter algo de verdadeiro lá para os anos `30 - época da Argentina rica e culta, milagrosa e modelar, dos palácios franceses e das colecções de arte capazes de fazer inveja a europeus e estadounidenses. A realidade hodierna é bem outra. Noventa por cento dos agro-pecuaristas são pequenos e medianos propritários, que arriscam, investem e trabalham diariamente com as próprias mãos: pais, filhos e empregados a arrostar com todo tipo de dificuldades, naturais ou criadas pelo homens, i.e., pelo Estado. Responsável pelo milagre económico argentino de 1880-1910 e tábua de salvação nacional em todas as (incontáveis) crisis que se abateram sobre o país, especialmente a débâcle de 2001/2002, os agro-pecuaristas vêm sendo expropriados através das chamadas "retenções" à exportação. Estas consistem em puro e simples confisco de altíssima percentagem do valor das vendas externas. Incrementada no último dia 11 de março (É assim! Aqui também a História registará um "11 de março"!) as famigeradas retenciones já atingem 44% do valor da produção. Se a isso acrescentamos os demais impostos o sector vê-se obrigado a entregar ao Estado mais de 80% do que produzem. Com tais recursos a máfia (des)governante bonnieclydeana pode dar asas à demagogia e à compra despudorada de votos e favores em grande escala. Esta foi a fórmula kirchneriana para a construção e manutenção do seu poder pessoal - um regime corrupto, truculento e rasca. Pela primeira vez mobilizam-se os agro-pecuaristas de Norte a Sul do país, acompanhados de largas franjas da população, em manifestações contra a perseguição safada e demagógica ao campo e, igualmente, contra as patifarias inumeráveis e inenarráveis destes salafrários instalados na Casa Rosada desde 2003. Das montanhas áridas e coloridas de Jujuy à Tierra del Fuego ouvia-se um só "cacerolazo", a dilecta forma de protesto à argentina. À uma manifestação pacífica e civilizada no centro da cidade de Buenos Aires Kirchner enviou a sua tropa de choque do rebotalho, os temíveis piqueteros, com as suas caras patibulares, os seus tambores e bandeiras e, sobretudo, os seus porretes e correntes... É a "democracia" daqueles que enchem a boca com o vocábulo para esconder a verdadeira face de déspota funesto, que não veio para salvar mas para servir-se. As câmeras registaram algumas cenas de pugilato, de agressão, de dentes partidos, e gravou para a posteridade o dirigente piquetero favorito do casal Kirchner, um inqualificado energúmeno que no CV ostenta um assalto a uma esquadra, toma de reféns e invasão de propriedade privada - além da chefia de uma secretaria de Estado no governo Kirchner I, a golpear um cidadão que manifestava a favor da gente do campo. Pese os casos isolados de violência física, não permitiu a Providência Divina que o choque frontal de interesses - os legítimos e os escusos - escalasse ao estágio de guerra campal. Os dois lados permanecem irredutíveis; o daqueles que têm a força da razão e aqueles que contam com a razão da força. O ódio sectário continua a ser uma faceta da vida desta comunidade política que há muito dá claros sinais de dissolução. Os adeptos da teoría dos ciclos afirmam que a Argentina experimenta uma grave crise a período de sete anos. A última deu-se no fim de 2001. Já não há pachorra.

4 Comments:

At 31 March, 2008 14:04 , Anonymous Anonymous said...

La valía de un Estado se comprueba en como trata a los expropiados (Napoleón Bonaparte dixit)

 
At 01 April, 2008 16:18 , Blogger Capitão-Mor said...

De qualquer forma é curioso verificar a psique colectiva dos argentinos que vêm para as ruas quando as coisas não lhes agradam. Bem diferente desta passividade irritante dos brasileiros!

 
At 06 April, 2008 00:23 , Blogger Marcos Pinho de Escobar said...

Así es Filomeno... Y, antes de todo, cuales son los fines de la expropriación?
Abr.

 
At 06 April, 2008 00:26 , Blogger Marcos Pinho de Escobar said...

Caro C-M,
Concordo inteiramente consigo! Na Argentina ainda encontramos alguma reacção. No Brasil a absoluta passividade diante das mais ultrajantes barbaridades é tão absurda quanto incompreensível. Tem algo de "Animal Farm"...
Um abraço.

 

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