Friday, October 22, 2010

Rumo ao abismo

Quem vive na Argentina, especialmente em Buenos Aires, já está habituado a sobreviver em estado pré-anárquico: numa sociedade em franca dissolução, como atrevo-me a dizer; em dissociedade, na justíssima expressão de Marcel de Corte. Um dos muitos aspectos do desordem crónico são as famigeradas manifestações e contra-manifestações diárias, com os seus piqueteros, e que, em diversos pontos da cidade, cortam avenidas e acessos vitais, e emporcalham ainda mais aquilo que alguma vez terá sido denominado "espaço público". Ontem a capital esteve em pé de guerra. Durante um dos vários "actos de protesto" que infernizam o dia-a-dia dos porteños, o choque entre uma agrupação trotskista e um bando sindical mafioso terminou em tiroteio, saldando-se por um morto e dois feridos graves - todos eles seguidores do velho Lev Bronstein. Acto contínuo, a comunicação dita social, o des-governo Kirchner, as oposições de pacotilha e os grupos directamente envolvidos no triste episódio, desfilaram a condenar a violência... "fascista" e a puxar a brasa às suas sardinhas. E assim, na base do "fascista-és-tu", fica tudo resolvido. Ou quase. Embora lamente profundamente a morte de um ser humano, seja ele quem for, não posso deixar de achar curioso que algumas centenas de indivíduos encapuzados, com porretes nas mãos, e que ostentam como distintivo o rosto daquele apóstolo da paz e da não-violência que foi o Che Guevara, venham agora armar-se em vítimas inocentes. Quem vive pela espada... Aqui já não há Estado. Ou melhor: o que resta dele está plenamente ocupado por um conglomerado de máfias. E do lado de fora, exceptuando-se os infelizes que sofrem e pagam as facturas, estão outras máfias à espera de um lugar à mesa. Tudo é questão de preço.

3 Comments:

At 25 October, 2010 07:38 , Blogger swedenborg said...

Ei Euro, e as outrora orgulhosas (diria até prepotentes) Forças Armadas Argentinas, Que passa?Existe ainda algum resto de nacionalismo por aí? Ou já está tal qual cá no Brasil, com a maioria dos generais "melancias"- verde por fora e vermelhos por dentro.

Abraço.

 
At 28 October, 2010 18:14 , Blogger Marcos Pinho de Escobar said...

Nem mais "Forças" nem "Armadas", Caro Swedenborg. Arruinados, humilhados, a malhar com os ossos na cadeia. Deixaram de existir. Abraços.

 
At 28 October, 2010 18:14 , Blogger Marcos Pinho de Escobar said...

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